quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Capítulo 21 - Um recomeço


Não era um dia de chuva, ou mesmo nublado. Sol quente fazia o caixão reluzir enquanto o padre pronunciava as palavras da Bíblia. Vovó Genevive, Eddie e, surpreendentemente, vô Léo choravam. Todos trajavam preto, o que aumentava consideravelmente o calor. No final, começando por mim, todos jogamos rosas vermelhas à falecida, para depois cada um jogar um pouco de terra. Foi breve, mas a todo momento senti olhares sobre mim, como se esperassem que eu chorasse copiosamente pela morte da minha mãe, ainda mais sabendo que ela morreu pra me salvar. Mas eu só me sentia triste por não conseguir fazer isso.
Voltando pra casa eu olhei várias vezes pra trás, um aperto no coração em saber que jamais a abraçaria novamente, mas, de novo, tentei me conformar sabendo que ela estava em paz, sabia que eu a havia perdoado.
Meu pai passou o restante do dia olhando por uma das janelas do casarão, pouco ligando para as crianças, filhos do capataz e sua esposa, correndo pela casa.
E assim passaram-se quase três dias, Joseph ainda me roubando beijos pelos cantos, mas sempre que a coisa ia se intensificando eu parava tudo, a culpa me impedindo. Mesmo assim, a vontade estava me deixando alucinada. Eddie não saía da porcaria da janela, a menos que fosse pra trocar de roupa e dormir, isso só servia para minha culpa se agravar.
Fui escovar meus dentes, já de pijama, quando Joseph me parou na sala, querendo conversar, mas sussurrava pra ninguém acordar.
- Posso falar com você?

Assenti e ele me levou até uma das salinhas da casa. Era distante do corredor dos quartos, silenciosa. Lá encontrei vários doces e salgados, postos em cima de uma mesinha, juntamente com jogos de tabuleiro e um sofá extenso.
- Tá tentando me subornar? – falei e ele revirou os olhos.
- Para de falar merda.
- Joseph Adams falando palavrão, quem diria? – fiz cara de quem tava chocada, o que o fez rir. Nos sentamos no sofá e eu não esperei pra abrir um pacote de salgadinhos, pondo vários na boca – É, eu tava precisando disso.
- Pra que modos à mesa, não é? – ironizou, vendo que minha boca já tava suja com os salgados.
- Exatamente.
- Aqui. – Joe pegou um pano e passou na minha cara como se eu fosse uma criança, daí eu tentei tirá-lo, só que isso só o fez me machucar sem querer – Desculpe.

Estreitei os olhos, pegando outro salgado do pacote e joguei na cara dele, que imediatamente entendeu o recado e devolveu, com doces. E lá estávamos nós: duas crianças fazendo guerra de guloseimas, sujando tudo sem nem se importar, rindo de maneira idiota.
- Espera! – paramos um momento e olhamos ao redor. A pequena sala que antes estava limpa e perfumada, agora era um verdadeiro caos comestível. Olhei pra Joseph e de repente estávamos rindo da coisa toda, quando senti que o timbre iria mais alto, corri e tapei a boca dele.

Claro que não bastou muito depois disso pra eu me perder de novo na atração por ele. Com minha mão sentindo a maciez de seus lábios, seus olhos tão perto dos meus e o imã que parecia me levar até ele, logo estávamos aos beijos novamente. Joseph me puxou e ajeitou minhas pernas ao redor de sua cintura, encaixando. O beijo se tornou intenso, suas mãos me puxavam ao mesmo tempo em que eu tentava me posicionar corretamente sem separar o beijo, de modo que eu acaba subindo e descendo sem parar. Seus dedos desceram para dentro da minha blusa, só que eu o parei novamente, o estalo retornando.
- Não... – foi difícil encontrar forças pra regular a respiração. Joseph me encarava com uma mistura de vários sentimentos: culpa, frustração, preocupação...
- Me desculpa. Minha intenção não era te forçar a nada, eu juro, só queria te distrair um pouco. To percebendo que todo esse clima tá te fazendo muito mal.

Ele tinha razão. Por mais que aqui fosse um lugar carregado de lembranças doces da minha infância, era como ressuscitar fantasmas do passado. Como não respondi, ele segurou meu rosto, levando meu olhar até o dele.
- O que tá te incomodando, pequena?

Respirei fundo.
- O meu pai. Dianna morreu, mas pelo menos eu estou em paz com ela, mas o meu pai... Ele amou tanto aquela mulher que não importava se ela se viciou em drogas depois da morte da filha mais velha e prostituiu a mais nova pra conseguir mais drogas. Ele simplesmente a internou numa clínica, não deu queixa e até parou de falar com a família. Tudo por ela. Agora que ela morreu eu não imagino que um dia ele vá se recuperar, e isso me preocupa. Meu pai é um homem muito bom, como não se acha mais hoje em dia, não merece passar por tudo isso.

Joseph assimilou cada palavra e abaixou o olhar, como se avaliasse bem suas palavras antes de dar uma resposta.
- Olha, pelo o que você me contou ele é um homem forte, muito forte. Pensa só, quem você conhece que alguma vez na vida seria capaz de suportar a morte de uma filha e depois ainda ter que largar a família pra ajudar sozinho a esposa viciada em drogas? Depois passar anos lidando com a segunda filha revoltada e ainda se reerguer da falência. Pode ser que essa seja a pior coisa que seu pai já enfrentou, sim, mas ele não tá sozinho. Pelo o que eu estou vendo ele só precisa de um empurrão, um motivo pra dar a volta por cima, uma notícia boa, e então se recupera. Você vai ver. – acariciou minha bochecha.

É, talvez ele tivesse razão, talvez eu estivesse preocupada à toa e meu pai não fosse se afundar numa depressão. Mas minha tensão não passava, cada vez que eu o via sentado na maldita cadeira olhando o vazio, mesmo não querendo, lembrava das palavras de Joseph como um engano feio.
Até que no dia seguinte, dois dias antes de voltarmos para Forks o capataz apareceu esmurrando a porta, desesperado, fugindo da chuva que estava vindo. Ofegava, usando uma capa de chuva, com um volume enorme na frente. Eu observava do canto da sala quando ele tirou a capa amarela, revelando um bebê choroso enrolado num manto.
- Alex, de quem é esse bebê? – sua esposa perguntou, alarmada.
- Não sei, encontrei na porta da igreja. Não consigo fazê-lo parar de chorar.
- Dê-me aqui. – ela tomou a criança nos braços e tentou acalentar, cantando baixinho, mas nada adiantou – Oh, criança. É uma menina, Alex, uma menina linda.

Meu pai olhou de canto, parecendo levemente intrigado. Relutante consigo mesmo levantou-se da cadeira pela primeira vez em dias. Todos ficaram tão estáticos nesse momento que nem contestaram quando ele pediu:
- Posso vê-la? – se aproximou, segurando a menina calmamente – Ela é linda. – disse, sua voz fraca, admirado. Como se o reconhecesse, a criança imediatamente se acalmou, agarrando-se a ele com as pequenas mãozinhas.

Algo próximo da alegria brilhou nos olhos de meu pai naquele instante, enquanto observava a pessoinha em seus braços. Ele sorriu, acalentando-a por mais alguns instantes, cantando a canção que dizia cantarolar para mim e Dallas quando éramos pequenas.
- Onde estão seus pais, pequenina?
- Eu não sei. – o capataz respondeu – Gritei por todos os cantos, pensando que houvessem simplesmente esquecido ela lá, mas ninguém respondeu. Ela iria ficar na chuva até agora se eu não a tivesse trazido.
- A mãe deve ter pensado que alguém a levaria para adoção, ou que as próprias freiras o fariam. – a mulher dele disse.

Eddie escutou as palavras e sorriu, acariciando o rosto da bebezinha.
- Vou cuidar de você, pequenina.


Ninguém contestou, sabíamos que era a melhor decisão, uma criança precisava de um lar e encontrou exatamente um homem que precisava de motivação. Joseph tinha razão, no fim ele ficaria bem, preenchendo seu vazio com uma nova esperança. Sorri, era o acordo perfeito.

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Fanfic acabando...

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